sábado, 30 de julho de 2016

A POETISA DO COCÃO DO PADRE

                 CONTOS


         01 -               A POETISA DO 
                           COCÃO DO PADRE

             O céu estava azul, nenhuma nuvem pairava no firmamento, o sol brilhava e em seu redor, mas por trás, deixava aparecer uma pequena névoa que com a luminosidade dele formava uma belíssima coroa dourada. Para um exímio observador podia-se ver raios que atingiam o Cocão do Padre que se refletiam nas árvores e ofuscavam os frequentadores habituais do logradouro público da cidade. Na verdade o Cocão do Padre era um chafariz, o mais frequentado e o mais importante, um prefeito habilidoso aproveitara a área circundante da fonte para fazer um belíssimo jardim, uma praça, um anfiteatro. As pessoas amantes da paisagem esplendorosa do lugar se deliciavam com as cuidadosas orquídeas de várias tonalidades: Lilás, brancas, amarelas, azuis, etc., que as rodeavam o Cocão do Padre, e não só as orquídeas como também roseiras, bons-dias, boas-noites, cravos, cravinas, hortênsias, lírios, margaridas e outras, que eram plantadas em canteiros que separavam os bancos dispostos em forma circular, são treze bancos, que foram doados por ilustres habitantes da cidade, por comerciantes e por políticos através de sorteio. Nos encostos dos bancos curvilíneos podiam-se ver nomes encravados em letras grandes e pintadas de escarlate e outras douradas, tendo por fundo, uma Estrela de Davi, eram nomes engraçados, além dos nomes dos bancos tinham também os nomes dos seus doadores - Alguns afirmavam que os nomes representavam os filhos do patriarca Jacó, o bíblico: (Ruben, Simeão, Levi, Judá, Issacar, Zebulom, Gade, Aser, Dã, Naftali, José e Benjamim, e a filha Diná), outros que eram nomes de deuses: (Terra, Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter, Urano, Saturno, Netuno, Plutão, Sete-estrelo, Urso e Órion), e os mais afoitos e intelectuais chamavam de personagens folclóricos. Nos bancos podiam-se ver os nomes: Saci-pererê, Caipora, Lobisomem, Cuca, Iara, Papa-Figo, Comadre Fulozinha, Boitatá, Mula Sem Cabeça, Mãe-d’água, Corpo-seco, Pisadeira e Boiúna. Além de plantas ornamentais de pequenos portes, podiam-se ver palmeiras imperiais, ipês roxos, amarelos e brancos, e flamboyants, que pelo natal caiam as folhas e surgiam flores branco-avermelhadas se parecendo com arranjos natalinos, por essa razão o flamboyant é também conhecido como árvore de natal.
             O Cocão do Padre era visitado por muita gente, pessoas se deliciavam com a beleza do logradouro. O logradouro tinha o formato de anfiteatro. As pessoas iam sentir o perfume suave das flores, outras: Principalmente mocinhas vinham como os seus cântaros apanhar água potável para beber e lavar as louças, outras vinham namorar, outras vinham tratar de negócios e outras vinham com a intenção de ver as calçolas das moças que se agachavam para apanhar a água e não se incomodavam em serem vistas e até faziam por onde suas ancas e suas calcinhas coloridas fossem expostas com se fossem carne penduradas nas vitrines nos açougues. Senome morava no Cocão do Padre, fugira de casa aos dez anos, após ser brutalmente espancada pelo padrasto, que queria violentá-la, ela não permitindo as intenções do padrasto, fora ameaçada, assim resolveu fugir. Agora tinha treze anos, uma menina-moça linda e assustada, quase selvagem, só saia do seu esconderijo quando se certificava que no Cocão do Padre não tinha ninguém.
Num recanto do Cocão tinha um banco que ficava junto à escadaria, era um espaço oco, e com certa habilidade a menina conseguira com algumas tábuas fazer um rude quarto e também uma portinhola. Do improvisado quarto, ela podia observar tudo sem ser vista pelos ocupantes do logradouro.
Certo dia o jardineiro flagrara a menina, foi um momento de muita aflição e medo, tentara escapulir, mas quando ia entrando no esconderijo, o jardineiro agarrou-a pelo braço e perguntou, queria saber o porquê dela fazer morada ali.
             - Quem é você? O que você está fazendo? Não tem casa não menina? Cadê os seus pais?
             - Eu não tenho pai e nem mãe, eu não tenho ninguém para tomar conta de mim – Não me mande ir embora, não tenho pra onde ir – Me ajude pelo amor de Deus.
             - Como vou lhe ajudar, esta história está mal contada – Sente aí, quero saber tudo, você não pode ficar morando nesta loca, você é uma menina, vivendo sozinha, sem roupa - E como você se alimenta?
             Simone narrou toda a sua vida ao jardineiro, à medida que escancarava a sua triste história, as lágrimas jorravam de seus belos olhos azuis, escorrendo face abaixo molhando os farrapos que serviam de vestimenta.
- Meu senhor - Eu não tenho pai, meu pai morreu, e sim, um padrasto safado que quis abusar de mim, com medo fugi de casa, a minha mãe não se importava com o assédio de meu padrasto, uma vez eu observei ela conversando o meu padrasto, ela disse que era normal, e se ele quisesse me molestar tinha a aprovação dela, que não se importava, e seria muito bom, eu poderia render muito dinheiro, eu poderia ficar com os homens e eles pagariam bem por que eu sou uma menina muito bonita e grande, e disse mais, se meu padrasto, se cansasse dela, minha mãe, me tinha, para servi-lo. Senti-me desamparada, com medo, sem apoio de minha mãe e de ninguém resolvi sair de casa. Sabe meu senhor, onde eu morava, era um prostíbulo, a gente morava num quartinho e era um entra e sai dos diabos, tanto minha mãe, como o meu padrasto não me respeitavam, as nossas comas serviam para eles venderem os seus corpos para qualquer pessoa, e jaziam questão para eu vê-los, isso foi me enchendo de ódio, essa é a minha história. E digo mais, já me acostumei com a minha sina e me sinto abençoada morando aqui nessa loca como o senhor diz, por isso não me mande ir embora, eu não tenho onde morar, eu imploro pelo amor a sua família.
             - E você conhece a minha família? Como?
             - Sim, muitas vezes eu tenho visto a sua esposa e as suas filhas brincando aqui nessa praça. Sinto uma saudade medonha, tem dia que eu gostaria muito de poder brincar com as suas lindas filhas, pelo pouco que eu entendo da vida, eu posso afirmar que o senhor tem uma família diferente da minha, o senhor tem uma família bonita e feliz. Mas eu não posso, eu não posso ser descoberta.
             - Quanto tempo você está nessa loca? Será que eu devo acreditar em sua história, me parece que você é bem espertinha – Sabe menina, sinto muito, você não pode viver aqui, nesse Cocão do Padre, vou falar com o Conselho Tutelar para arranjar um lugar para você ficar, aqui é que você não pode ficar, pois se ficar eu serei cúmplice e posso até ser preso – Quantos anos você tem?
             - Eu tenho treze anos. Faz três anos que eu moro aqui?
             - Treze anos! – Três anos que está aqui? Menina, você é muito boa em ocultismo, essa é uma história e tanto – Você está mentindo. Acho bom você contar a verdade. Como você toma banho e se alimenta?
             - Bem! Eu me lavo quando não tem mais ninguém aqui - Eu saio de minha loca, e quanto à alimentação, eu como os restos de comida que ficam em cima dos bancos: Sanduíches, balas, biscoitos, bolachas, bolos, bananas, outras frutas. Tem um casal de senhores já bastante idosos todos os dias se sentam no banco chamado Comadre Fulozinha, deixa comida para os pássaros e os saguis. Confesso meu senhor - Se não fossem eles eu há muito tempo tinha morrido de fome. Assim que cheguei aqui eu passei três dias sem comer, quase eu morri, foi aí que esse casal de anjos apareceu e tem me sustentado todo esse tempo, sem saber de minha existência, é claro que eu divido a boia com os pássaros e os saguis, me dá uma vontade de agradecê-los, porém não posso. Outro dia eu quase fui pega, um casal de namorado que costumeiramente se senta neste banco que é a porta de entrada de minha casa, peço-lhe que não me julgue, eu tenho roubado muitas vezes os sanduíches que eles trazem, eu fiz um buraco que dá para o banco, quando eles estão no bom-bom, eu pego um sanduíche, não pego os dois para não provocar muita confusão, afirmo ao senhor que é muito engraçado quando eles questionam quem comeu um sanduíche – O namorado diz que foi a namorada e a namorada diz que foi o namorado - o xingamento é grande, depois eles dizem que foram os saguis, e assim a harmonia é estabelecida, isso me dá um prazer enorme e me encoraja para eu segui em frente, e permanecer aqui, é muito divertido, eu sei de cada história que o senhor não imagina, de quando em quando alguém deixa uma roupa, camisa, calça, blusa, vestido, sandália, jornais, revistas, cadernos canetas, lápis e muitas coisas que me servem muito,  eu apanho-os dou um trato. O meu divertimento é ler e fazer poemas eu já fiz muitos, quer que eu declame um para o senhor?
             - Quero sim.
             - Não ria de mim, como é o nome do senhor?
             - Zé do Cocão do Padre.
             - Esse nome eu já sei, o seu nome de batismo.
             - Eita menina abusada! É uma enrolação medonha... - Eu me chamo José Palmeirindo da Silva.
                                    - Eu sou Senome, habitante do Cocão do Padre, vou declarar um poema de minha autoria
MENINO DANADO

Eita! Menino sapeca
Do jeito que o diabo gosto,
Com o sorriso encantador
Faiscando em relances
E se derretendo em amores.
Seus lábios carnudos em busca de paixão
Procurando um delicioso pousar.
Envolvido em tremores
Trepidando em fulgores
Querendo animar.
O peito tremula o coração
Estufado pela pressão
Querendo pular.

O rubor das maçãs do rosto
Se inflamando em volúpias
E imaginando se entregar
Ao embalo, à paixão e ao amor.

Eita! Menino dos meus sonhos...
Daria meu amor em troca dos teus pensamentos.
Voaria entre as nuvens
Conquistaria as estrelas
E até o firmamento.
Andaria em teu corpo em delírios,
Navegando entre as águas
Da clarividência do meu ser.
            - Que maravilha, você é uma poetisa, está de parabéns, confesso que eu estou altamente impressionado com você, você é especial – Mas continue com a sua história...
- Bem! Quando saí de casa eu trouxe alguns objetos, e o estojo de costura, linhas, tesouras, dedal, faca, alicate, agulhas e outros bagulhos - Aprendi a ser esperta, é a lei da sobrevivência. Uma coisa me deixa triste, é a falta de alguém para conversar, mas já estou acostumada com os cânticos dos pássaros e principalmente dos saguis, estes sim, são meus amigos de verdade, é com eles que eu me desabafo, rio, choro, conto as minhas alegrias, as minhas tristezas, as minhas mazelas, a saudade de meu pai, das minhas colegas de escola - Uma coisa eu afirmo com toda convicção - Eu não sinto nenhuma saudade de minha mãe e de meu padrasto, e nem das mulheres e dos homens do prostíbulo. Na verdade eu tenho penha de minha mãe, e tenho orado por ela, para que ela deixe aquele miserável, se arrependa das coisas feias que fazem, e que me procure.
             - Menina - Como é o seu nome?
             - Sabe de uma coisa, eu não tenho nome – apaguei-o de minha memória, enterrei-o quando eu deixei a minha casa, eu me chamava Simone, agora eu me chamo de Senome.
             Seu Zé do Cocão do Padre, como é chamado, José Palmeirindo da Silva, trabalha como jardineiro há mais de doze anos, estava abismado com a história da garota Simone: A sua eloquência, a sua intrepidez, a sua beleza, a sua linguagem correta, o seu fantástico poema e a sua firmeza em detalhar a curiosa e a arriscada vivência no Cocão do Padre. Sentia a grande diferença entre ela e as suas filhas: Bem tratadas, amadas, a felicidade batendo à porta, tinha uma linda esposa e duas pedras preciosas que formavam uma família feliz, via suas filhas brincando com as coleguinhas e vizinhas, comparava a garota do Cocão com a sua filha mais velha que tinha a mesma idade, começando a ser uma mocinha - A orientação da mãe - A ensinar-lhes o caminho da verdade e da vida, o comportamento, a união, os bons costumes, sentia-se triste em observar uma pobre menina vivendo escondido numa loca de uma praça, de sua cidade, justamente a praça em que dedicava o seu amor ao trabalho voluntário, edificante, prazeroso, a alegria de ver o crescimento e a floração das plantas ornamentais, que eram lisonjeadas e apreciadas pelos frequentadores, e dos inúmeros elogios recebidos. Muitas mulheres pediam conselhos e mudas, o que eram atendidas, isso deixava a sua alma profundamente alegre, tinha consciência de sua competência e dedicação à fauna e à flora, pois tinha o curso superior de agronomia, que brilhantemente fizera na Universidade Federal. É bom esclarecer que o doutor Zé do Cocão do Padre trabalha numa grande empresa horto-granjeiro, mas mesmo assim, continuava a dar a sua parcela de conhecimento ao Cocão do Padre, o seu primeiro emprego, que foi o começo de sua vida universitária. Ponderava quando fora envolvido pela emoção, os brilhantes olhos azuis da menina que lacrimejavam se cravaram em seus olhos castanhos, isso foi a gota d’água para o durão Zé do Cocão do Padre desabar, sem controle abraçou a menina como se fosse a sua filha Viviane, os dois se sentaram no banco Comadre Fulozinha, e em pensamento traçou um plano para tirar Simone da praça.
             Foi neste estado emotivo que a sua esposa e as suas filhas flagraram o casal de chorão sentado no banco da praça.
              - O que é isso meu velho? – Que chororô? Perguntou a sua esposa atordoada, sem entender as reais circunstâncias.
             - As filhas perguntaram – Papai quem é essa moça, o senhor está chorando?
             - Não... Não... Não... Esta menina está perdida - Vamos levá-la para casa, ela não pode viver aqui nessa loca - Neste Cocão do Padre.
             - Vamos com clama, explique melhor essa história. Virando-se para a menina perguntou - Quem é você?
             - Eu sou Senome, melhor, eu me chamo Simone, o seu esposo descobriu o meu esconderijo, eu moro aqui dentre, debaixo desse banco, não me tirem daqui, eu não tenho onde morar, tudo que eu tenho está aqui.
            - Que história é essa? É verdade seu Zé.
             - Sim - É a mais pura verdade, essa menina há três anos vive escondida aqui, eu a descobri há poucos instantes. Vamos levá-la para casa, aqui ela não pode ficar.
              Viviane juntamente com a sua irmã Vivian perguntaram a Simone se elas podiam olhar o seu esconderijo. A menina envergonhada disse:
- Não. Minha casa não é lugar para duas princesas visitarem, a bagunça é grande, eu não tenho nada de interessante para se ver.
             - Vivian arrematou – Não – Não somos princesas, queremos ver. - Vai... Deixa a gente ver a sua casa.
             - Sendo assim! - Vamos.
             As duas filhas do doutor Zé adentraram na loca e constataram a pobreza e a tristeza do local, um buraco com uma improvisada cama de tijolo sem colchão, coberta por pedaços de pano velho, uma mala velha com farrapos que serviam para vestir a garota, algumas frutas estragadas - Abraçadas choraram copiosamente.
             - Meu Deus o quê é isso? Como você aguenta morar aqui?
             Enquanto as meninas estavam dentro do buraco, o doutor Zé narrou à história de Simone, Dona Luiza se comoveu profundamente, seus olhos lacrimejaram e com dificuldade para falar pediu ao esposo que a levasse para casa.
- Essa menina não pode viver nessa loca, vamos levá-la para casa, procuraremos os seus pais ou os seus responsáveis, se não encontrarmos, o jeito é a adotá-la!
- Você quer fazer isso Luiza, a responsabilidade é muita grande?
- Sim - Essa menina é especial, é uma guerreira, uma coitada. Não é mesmo?
As três meninas saíram da loca ainda chorando. Simone simpatizou-se com o seu Zé e com a sua esposa Luiza e com as suas filhas, eram agora seus amigos e que quando eles quisessem poderiam vir para a sua casa, pois as portas estavam abertas, isto é, se não fosse expulsa. Simone observou que os quatro se abraçaram e sem receios choravam, uma cena altamente emocionante e animadora, Simone sem entender direito, disse carinhosamente.
- Vamos acabar com esse chororô, obrigado por me deixar viver aqui.
- Não. Não – Você vai morar conosco, vamos providenciar os seus documentos, você precisa estudar, de agora em diante você é a nossa filha. 

JUARÊZ CARLOS
PRESIDENTE DA ACADEMIA PALMARENSE DE LETRAS – APLE
CADEIRA 4 – PATRONO HERMILO BORBA FILHO
Palmares, 24/05/2016




                02 -                CAMBITO


O Engenho Paul é uma propriedade rural situada à margem esquerda de quem vem da capital do estado pela mais importante rodovia federal, e também margeia uma pujante cidade banhada por um famoso rio que oferece muitos benefícios aos habitantes ribeirinhos, além de benefícios físicos, concretos, reais, o rio serve de inspiração para escritores, poetas, romancistas, contistas e compositores, e até para os artistas plásticos criarem suas magníficas telas que são imortalizadas pelo tempo. O Engenho Paul é um marco indelével, por causas de suas histórias e abrigos de seus frequetadores. A casa grande é situada num ponto estratégico, e dela pode se avistar toda a cidade, uma casa construída no meado do século XIX, não é muita antiga, com se percebe pela sua cronologia, entretanto a sua arquitetura remota dos tempos antigos, as paredes de espessura gigantesca, construídas de grandes tijolos crus, os experientes em construção civil afirmam que o seu modelo colonial gótico é do início do primeiro milênio da era cristão, a parte térrea é bastante arejada nota-se colunas gigantescas em forma de arco, dando um aspecto de uma centopeia gigante, e serve para sustentar o pavimento superior, a casa propriamente dita. Os seus proprietários, nobres pertencentes da coroa portuguesa enchem-se de orgulho quando são visitados. Entre a rodovia federal e a casa-grande tem uma fonte d’água, talvez a parte mais importante da propriedade, é denominada a Bica de Paul, a fonte de água cristalina e potável jorra da terra, como se fosse um geyser, desta maneira a bomba d’água não necessita de energia elétrica, basta apenas acionar uma alavanca para o geyser jorrar a preciosa água mineral, quando não se tinha na cidade água encanada, tratada pelos sistemas de abastecimento, o povo do lugar ia a bica de Paul buscar água para beber, e também se banhar na referida bica, assim pode-se ver crianças, meninos, adolescentes, adultos e velhos indo à bica. Seus proprietários não se incomodam com a multidão e até incentivam os habitantes da cidade, mesmo agora que haja sistema de tratamento d’água. O caminho mais curto para os habitantes da cidade irem até a Bica de Paul é a através da jangada do seu Biro Banguelo, apelido que herdara quando os dentistas extraíram todos os seus dentes, tendo em vista uma grave enfermidade odontológica, aconselhado a colocar prótese, mesmo gratuitamente ele se recusa, dizendo.
- Eu me acho lindo assim, para que ter dente se não tenho carne para comer não existe no mundo ninguém que me faça usar dentadura, eu tenho um nojo medonho.
- Mas seu Biro o senhor fica mais bonito, as meninas vão caírem em cima do senhor, deixando as meninas a sua esposa o que acho disso.
- Ela até doutor acha bom - assim quando eu a beijo não corre o risco de mordê-la, é o que ela diz, sabe eu já estou acostumado, e como seria o meu nome se eu tivesse dentes, Biro Dentuço, esse nome eu acho horrível. Não - Agradeço ao senhor a sua gentileza, mas eu estou bem assim.
O Engenho Paul tem uma área estrategicamente e propositalmente deixada para o cultivo nativo de araçás-do-campo, uma goiabinha altamente gostosa, a meninada faz festa, às vezes corre quando os empregados do engenho se aproximam, entretanto eles recebem ordens para não deixarem apanhar, os meninos agradecem e tome dente nos araçás.
- Não precisam correr o meu senhor não se importa não.
- A meninada volta e se delicia, é uma beleza!
Ao lado da Casa-grande existe um campo de futebol, num local privilegiado, pois o mesmo se situa numa baixada e as ribanceiras servem de arquibancadas, não só os futebolistas, mas também a plateia que gosta de apreciar a garotada e os marmanjos baterem uma bolinha, lamentavelmente, muitas vezes, a estudantada foge das salas de aulas para vibrar com as jogadas de seus fãs jogarem, entretanto, isso faz parte da juventude. Desse campo de futebol muitos jogadores se destacam no cenário do maior esporte brasileiro, entre eles vamos encontrar o artilheiro Cambito. Cambitoa, recebera esse apelido de seu tio Tião, devido a sua estatura e o seu corpo ligeiramente encurvado para frente, as pernas longas e finas, assim o conjunto formava um Cambito, {perna fina, de homem ou mulher, haste, gancho ou suporte fino de madeira, cada uma das forquilhas ou ganchos em forma de V, madeira, que se prendem às cangalhas de cada lado do dorso de animas de carga}.

                         Cambito era órfão de pai e de mãe, eles morreram num acidente automobilístico. Fora criado pelo tio, irmão de seu pai, logo cedo o garoto se interessou pela bola, estudioso e querido pelos seus colegas, era o melhor aluno do Ginásio Municipal, de compleição atlética, se destacava nos torneios estudantis, um centroavante nato, {jogador(a) que atua no ataque (camisa 9), tradicionalmente entre o meia-direita e o meia-esquerda, no sistema WM entre o ponta-direita e o ponta-esquerda, modernamente como ponta-de-lança; atacante, centroatacante, comandante}, era disputado por vários colégios da cidade em que morava e da região.

                      - Menino o meu colégio oferece uma bolsa de estudo para você, quero formar um time de gente grande, e você é o caro, você é muito bom, se topar é só procurar a nossa diretoria, será um grande prazer tê-lo no meu colégio.

                      - Agradeço, mas do meu querido ginásio eu não saio nunca, melhor só depois de cursar o ensino fundamental, sabe diretor eu que ser alguém, eu quero me formar, eu pretendo fazer odontologia para consertar a boca de Biro Banquela.

                      - Olha menino! No meu colégio você poderá se sobressair no futebol, eu tenho um convênio do melhor e o maior time de futebol da capital, você poderá se tornar num jogador profissional.

                      - Sabe de uma coisa deixe o tempo correr, eu ainda sou muito novo, se a sorte aparecer para mim, poderá acontecer em qualquer colégio, mas por enquanto eu não quero deixar o ginásio, mas uma lhe agradeço.

                      - Cambito eu não vou desistir de você, seja no meu colégio ou em qualquer outro da cidade eu estarei lutando para levá-lo para um time grande, a sua fama de bom jogador corre pela capital, os melhores times têm interesse por você, não deixe essa oportunidade passar, eu já falei com o seu tio e ele concorda comigo, no torneio interescolar da próxima semana o olheiro do Esporte virar lhe observar. Olha! A minha proposta está de pé.

                      - Sei - Vou falar com o meu tio, o que ele resolver eu acatarei, devo tudo a ele, ele é o meu tio, meu pai e minha mãe.

                      O tio de Cambito tinha vinte e dois anos, começou a criá-lo quando o garoto tinha seis anos, isto é, começou a criar o sobrinho com 14 anos, um menino ainda, uma verdadeira tragédia, pois todos morreram no acidente, o ônibus em que viajavam para capital tombou e vitimaram vinte e cinco passageiros que iam para um encontro de casais na capital, Cambito e o tio escaparam porque não podia participar do encontro que era apenas para casais. De sua família morreram: Seus pais, seu irmão, sua cunhada e os pais dela, seis pessoas de sua família.
                      Abalado com a tragédia, e refeito das emoções, a empregada doméstica da família criavam os dois. Como sendo o velho tomava conta de Cambito.  O tio estava concluindo o curso de educação física, gostava de futebol, entretanto não podia jogar devido a uma ligeira deficiência física, tinha uma perna maior do que a outra, mas era o melhor treinador de futebol da cidade. Fora ele que incentivou o sobrinho a jogar. Os garotos passaram por muitos obstáculos, sem pais e sem mães, apenas a velhota para tomar conta deles. Viviam das pensões que os pais de Cambito deixaram, eles eram funcionários públicos federais, vieram de Brasília gerenciarem o Departamento Social Federal, ambos eram formados em assistência social.

JUARÊZ CARLOS

PRESIDENTE DA ACADEMIA PALMARENSE DE LETRAS – APLE
CADEIRA 4
PATRONO HERMILO BORBA FILHO

PALMARES – PERNAMBUCO - BRASIL

sexta-feira, 29 de julho de 2016

AS CURVAS DA MORENA

AS CURVAS DA MORENA
Nas curvas da morena
Alucinadamente me perdi
E, afoito povoei cada meandro
De seu corpo nu
Ao escutar a doce sinfonia!
Me embriaguez nas carícias
Da suave fragrância
Do mais puro jasmim;
E assim...
Nesse entrelaçar de ternuras
Pendurei-me em seus lábios carnudos,
Que me levaram as alturas.                                       

Em certo momento
Tive medo de me sucumbir
Ao escalar as montanhas de seu ventre -
Macio, aconchegante,
Galopante e ardente.
Contudo, usei as rédeas,                              
A tempo de frenar minha ignomínia,
Meus execráveis pensamentos,
Mas envolvido em loucos momentos
Continuei a subir.
E no topo do prazer
Suguei o néctar do bem querer
E em boa hora surge o despertar,
A felicidade, o acalentar,
Os preâmbulos, a letargia
Da abrasadora fantasia.

JUARÊZ CARLOS

EXEGESE

EXEGESE
(Efésios 6: 10 -20)

Perguntaram-me.
- Tudo bem?
- Respondi, tudo!
Tirando os grilos, as dúvidas,
os obstáculos, as angústias, os enfados,
as tristezas, as lamúrias, as mazelas...
Tudo bem!

Perguntaram-me.
- Como assim?
- Respondi, sim...
Estou vivendo
cheio de grilos...
Atordoado, angustiado, enfadado,
desanimado, atribulado...
Mas tudo bem!
É a vida terrena.

Perguntaram-me.
- O que vai fazer para sair dessa?
- Respondi, matar os grilos...
Atropelar as tristezas, os enfados,
as angústias, as mazelas, os medos,
as tribulações, as tempestades...
Dedetizar tudo.

Perguntaram-me.
- Qual o veneno - a arma?
- Respondi, a Armadura de DEUS,
pois ela apagará de minha vida,
de minha memória...
Tudo, tudo, tudo.
Cingindo-me com a Verdade;

Vestindo-me com a Couraça da Justiça;
Calçando-me com a pregação do Evangelho da Paz;
Embraçando-me com o Escudo da Fé;
Protegendo-me com o Capacete da Salvação;
e
Empunhando a Espada do Espírito;
que é a Palavra de Deus.

Perguntaram-me
- Quando isso acontecerá?
- Respondi, agora.
Basta crer,
pois as coisas deste mundo cessarão,
as lembranças da Terra desaparecerão,
as feridas se cicatrizarão,
as dúvidas dissiparão,
as turbulências apagarão...
Enfim a Paz reinará.

Perguntaram-me.
- Qual o Caminho?
- Respondi, JESUS CRISTO.

Perguntaram-me.
- Qual a Verdade?
- Respondi, JESUS CRISTO.

Perguntaram-me.
- Qual a Vida?
- Respondi, JESUS CRISTO.

      Juarez Carlos
Acadêmico da Academia Palmarense de Letras – APLE

Cadeira 4 – Patrono Hermilo Borba Filho

Haicai

Vem a enchente
Causando inundação

Destruindo tudo.